sábado, setembro 19, 2015

Interpretação do texto "Gustavo e Amélia": uma questão de atenção, compreensão e perspicácia


Com as novas metas curriculares foram introduzidos textos cada vez mais exigentes, tanto a nível de extensão, como de conteúdo. Por isso, é cada vez mais importante que as crianças façam, efetivamente, uma leitura compreensiva e sejam capazes de mobilizar conhecimentos. Não interessa ler por ler. Interessa ler, pensar, formular hipóteses, inferir, perceber sentidos e informações "subreptícias", mas muito importantes para a compreensão de todo o texto.


Segundo Irwin (1986) e Giasson (1993) a compreensão da leitura pode ser decomposta num conjunto de sub-processos que devem ser explícita e sequencialmente ensinados. Os primeiros a serem ensinados são os microprocessos, que têm como função o reconhecimento e agrupamento de palavras e a identificação da ideia principal da frase. À medida que se desenvolve a competência da leitura, também estes sub-processos se vão tornando mais elaborados.

Um dos sub-processos mais importantes nesta fase de ensino em que me encontro são os processos elaborativos (que permitem ao leitor integrar os conhecimentos prévios, formando imagens mentais e ajudam o leitor a fazer previsões sobre o texto, a reagir afectivamente ao texto) e os processos metacognitivos, que permitem a monitorização da compreensão na leitura, sendo importantes para a identificação e reparação da falta de compreensão.

No texto "Gustavo e Amélia"(visível na imagem), que trabalhamos durante esta primeira semana de aulas, foi notória a lacuna destes processos metacognitivos em vários alunos. Porquê? Porque mais de metade do texto induziu as crianças e qualquer leitor (até eu mesma) a pensar que "Gustavo" seria um menino. Até que num parágrafo, à partida sem especial interesse, uma pequena pergunta de "Gustavo" a outra personagem nos fez perceber que afinal se tratava de um espantalho. Aqui foi preciso fazer um "upgrade" à linha interpretativa que estava a ser seguida, pois se não fosse feita,  as crianças errariam quase toda a interpretação do texto (aliás, como aconteceu em alguns casos).


“Uma só linha de um texto desata muitos processos mentais no leitor. O conjunto destes processos é o que gera a compreensão.” (Alliende & Condemarín, 1987:139)

Já agora, depois de lerem o texto, que resposta dariam à seguinte pergunta:

"Alguns amigos de Gustavo tinham ido embora. 
Por que razão teriam partido?"

Podem deixar a resposta no comentário. :-)

5 comentários:

Cláudia B disse...

Para mim o texto realmente tem muito que se ler nas entrelinhas, que se olharmos de forma simples não será óbvio. Quanto aos amigos penso que partiram porque foram caçados, Gustavo não os conseguiu proteger.

Ana disse...

Que complexidade!!!!
Após um esforço de interpretação diria que a resposta seria por causa dos caçadores, mas os miúdos certamente não chegavam lá.
Coitadinhos dos nossos meninos, nós sabemos que chegam lá, mas acredito que podiam ter a vida mais facilitada, com tempo para serem criança

Anónimo disse...

Leonor, infelizmente, ao longo deste ano, vais deparar-te com textos tão ou mais complexos que este. O vocabulário, o sentido dos textos, a informação que tentam transmitir são cada vez mais abstratos. Poucos são os alunos que apresentam uma capacidade de abstração e compreensão tão desenvolvidas. Talvez por falta de hábitos de leitura, mas também por não apresentarem, ainda, maturidade cognitiva que lhes permita compreender a verdadeira essência deste tipo de textos. Como professora, continua a promover momentos de leitura individual, mas também em grupo. O partilhar de ideias e a análise das diferentes perspectivas vai acabar, com certeza, por incutir nos alunos um pensamento mais crítico e uma capacidade superior para formularem diferentes hipóteses face ao mesmo texto.

Dora Fonte

Anónimo disse...

Quanto à questão que colocas, considero que pelo menos duas hipóteses podem ser consideradas corretas. Os amigos do Gustavo partiram pois acabaram por morrer ou ( e prefiro este hipótese) fugiram com medo do caçador. ;)

Dora Fonte

Teresa Silva disse...

Penso que talvez os amigos do Gustavo tenham reconhecido nele características mais humanas do que de um espantalho, e isso talvez os tenha assustado pelo medo que tem dos caçadores, também eles humanos.
O texto é lindíssimo, contudo a boa interpretação dos alunos é resultado da forma como pensam por si mesmos, como vivenciam a história e a interpretam não só apenas gramaticalmente mas também no significado implícito da história.
Ensinar a pensar é ensinar a reflectir sobre algo, a interpretar os seus diversos significados escondidos em palavras e frases.
A interpretação é também reflexo do pensamento cognitivo e muitas vezes da imaginação.